domingo, 12 de setembro de 2010

um céu de brinquedo

o pequeno garoto, do alto de seu tênis all-star azul número 25 que acabara de ganhar de aniversario, desbravava os galhos do quintal na noite fresca de primavera. Na sola, algumas folhas grudadas do fim do inverno, enquanto nas mãos buscava a flor da primavera (a planta, a mãe tinha explicado que a estação não existia por causa da árvore, e sim, o contrário).

Pra alcançar a flor teve de se apoiar no galho, e pra se apoiar, acabou se espetando. Não entendia porque uma planta tão bonita tinha espinhos que não deixavam chegar perto dela, só com muito cuidado. Com o dedo espetado, deu um grito engolido, soltou um palavrão que ouvia o irmão dizer quando estava bravo, mesmo sem saber o que significava, 'filho da puta', na inocência. Chupando o sangue do dedo, não gostava daquele sabor de ferrugem que tinha o sangue, e começava a pensar se as coisas enferrujavam porque estavam sangrando de velhas. Começara a imaginar se todas as coisas tinham sangue e coração, e começou a ficar com dó da sua bicicleta, que ficou abandonada e se avermelhou toda. Não dava mais pra usar. Começou a se culpar por ter matado a bicicleta, no começo teve um medinho, mas pensou melhor e viu que se ela realmente tinha sangue e coração, ela devia ter ido pro céu das bicicletas, já que ela sempre foi uma bicicleta muito boazinha, sempre o ajudou quando quis brincar, e só o derrubou uma vez, mas ele sabe que não foi de propósito.

Olhou pro céu pensando na bicicleta e que agora ela devia estar por lá, toda azul e brilhante, correndo dum lado pro outro, levando algum anjo pra dar uma volta.

Tirou o dedo da boca e viu que tinha parado de sangrar, olhou pro céu de novo e rezou do jeito que tinham lhe ensinado. Pediu pra papai do céu que cuidasse bem da bicicleta e que ela olhasse por ele lá de cima agora.

A mãe chamou pra jantar quando ele acabou de falar amém. O garoto correu até a cozinha e chegou tão rápido que se surpreendeu.

Antes de dormir, se ajolheu na cama e agradeceu, a bicicleta, por ter lhe dado aquele empurrãozinho, ele sabia que só podia ter sido ela.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

aos irmãos




    sentado, pensava e consigo conversava  
      - que coisa 
      - são pessoas fantásticas, não é? 
      - absolutamente... 
      - ... 
      - sabe o que eu acho? 
      - ...diga - que desse jeito não se encontra, nem no gibi, nem na tv ]
      - é... acho que é bem por aí 
      - ... 
      - quem sabe, videogame? 
      - é... quem sabe... 
      - ... 
      - ...  
            e não se acha, nem no videogame

          sexta-feira, 3 de setembro de 2010

          cansado no paraíso



          Foi assim que me senti assim que cheguei. Os pés estavam em frangalhos. Não imaginava que teria de vir caminhando. Sempre que pensava nisso achava que, se eu viesse, seria voando, flutando, nadando... Nunca andando. Bobo eu, de não imaginar que seria da forma mais simples.

          Eu até tentei correr em alguns momentos, mas não adiantava. A gente descobre que não escolhe muita coisa.

          Eu não pequei, eu não menti. Em todo esse tempo eu tentei sorrir pras pessoas, mesmo sem estar contente. Tentei ouvir as palavras, mesmo quando me tapavam os ouvidos. Tentei enxergar na escuridão. Tentei sentir na solidão.

          Sempre quis ser mais forte, mais corajoso, mais jovem, mais esperto, mais bonito. Queria que nada me doesse, sem saber que é da dor que a gente aprende muita coisa. E, por nossa sorte, no amor a gente aprende mais ainda. Eu não pequei, nem menti. Eu também não morri, se é isso que você está pensando. Eu apenas descobri que precisava caminhar. Esse era o único jeito de chegar. Estou cansado. O caminho foi longo.

          Isso é um sonho, caso você não tenha percebido. Um sonho desses que em meio a todas as coisas que podemos fazer dentro dele, optamos por caminhar. Um sonho de verdade. Desses de acordar cansado, mas feliz. Desses de acordar e nos contar uma mentirinha. Que se sonhamos em caminhar, podemos voar enquanto estamos acordados.

          Eu não caminho sozinho, as pessoas em minha volta estão comigo, dentro e do meu lado. Elas caminham do mesmo jeito que eu, e me apoiam se eu tropeçar. Assim como eu segurarei as suas mãos, sempre que precisarem. Nós estamos todos cansados. Os pés em frangalhos, mesmo de andar sobre o algodão. Nós não pecamos e nem mentimos.

          E por hora, só queremos descansar.

          Ao menos até acordar.