sexta-feira, 23 de novembro de 2012

O menor poço dos desejos do mundo.



Existe nessa vila, próxima ao lugar no qual todos esperam encontrar o final do arco-íris, o menor poço de desejos do mundo. Ele é tão pequeno que é possível  fazer apenas um pedido, apenas uma pessoa, até o dia em que a moeda se dissolver na água. Só então o próximo pedido funcionará.

Dizem que o último pedido foi feito pouco tempo depois que inventaram a primeira moeda e o primeiro poço. Pois não existe poço sem moeda, e não existe desejos sem poços. Conta o ancião que o primeiro pedido, foi também o último, sobre o suas intenções, alguns dizem que foi encontrar um amor verdadeiro, outros que foi a ressureição do Cristo. O que não deixa de ser a mesma coisa, em algum nível e de alguma forma.

O imbróglio é que a primeira e última moeda estava prestes a se dissolver e, os poucos que sabiam da existência e da localidade de tal poço ansiavam por desejos mais modernos, como a vida eterna ou o iPad mais novo todo ano.

No exato dia em que ela se dissolveu, houve muita briga e discussão na região, todos tentaram arremessar sua moeda ao mesmo tempo e nenhum dos pedidos foi realizado.

Sentido-se enganados pelo velho ancião, os pedintes foram indaga-lo sobre tal farsa.  O encontraram em sua casa com os olhos tão brilhantes que nem lhes dava bola. 


_Ei velho, pedi a vida eterna e nada me aconteceu, você me enganou! – Disse um dos revoltosos

_ ...


_ Responda velho! O que tenho de fazer?

_ ...

_ Ora seu...

_ De que adianta a vida eterna se não tem nem paciência?

_ ...

_ E digo mais, acho que me confundi quando contava a história, só pedi pelo meu amor verdadeiro hoje, e não dá última vez como havia dito. Então me deem licença, obrigado.

_ ...


E assim se foram os pedintes revoltosos, estupefatos.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

gelatina de festa


Quando percebeu já estava correndo. Não se lembrava de ter acordado. De ter ido dormir. Deu-se conta quando viu o asfalto se transformando em terra que se transformava em cimento que se transformava em grama. Seus pés se mexiam em harmonia, se encontrando de relance para logo se distanciarem novamente. E a grama virava areia. E o tempo não parava de passar. Quando percebeu que estava correndo, foi quando seu joelho começou a gritar. Foi quando, que em mais dois ou três passos, se acostumou ao incômodo. E o grito foi ficando baixinho. Ou tão constante que já nem se dava conta. E a areia virou asfalto.

Quando foi que parou de pensar se o vento que batia no rosto era da natureza ou se era por ele estar correndo? Se corresse mais rápido, ventaria mais forte? E se o vento estivesse em direção contrária? Não sentiria vento algum? E o asfalto virou gelatina. E era de uva. Assustou-se com a perda de equilíbrio. Quis voltar para o asfalto. Não iria conseguir correr tão rápido por ali. Mas foi até lembrar-se que sempre sonhara em caminhar sobre um chão de gelatina. E então caminhou. Parou de correr. E então saltou cada vez mais alto. E em pleno vento quase parado, a muitos pés de altura, lembrou-se do seu joelho que gritava. E foi quando percebeu que ouvia um assovio, o chão de gelatina era como música para seu joelho.


E a gelatina de uva virou gelatina multicolorida. Ele deitou, balançou e sorriu. Soube que estava sonhando, por isso não se lembrava de ter acordado ou de ter dormido. 


Quando acordou, estava na cama e descoberto. Eram cinco e quarenta da manhã. O vento soprava pela fresta da janela. Sentou, abriu o que faltava da janela e dos olhos. Assistiu ao nascer do Sol. Tão colorido quanto à gelatina.

E foi nesse mesmo dia que, dentre outras coisas menos importantes, ele comprou um colchão de água.