quinta-feira, 21 de março de 2013

a mesma praça

Ele corre pela calçada sem pensar em si. Não dá conta de seus passos para pensar em seus atos. O fone de ouvido está desligado. Não que ele tenha percebido. A música já não toca mais dentro dele.

Imerso nos seus pensamentos a ponto de sequer notar que havia acabado de cruzar com o algoz de sua solidão.

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Do outro lado da rua, ela anda cabisbaixa, ouvindo trechos nunca concluídos de conversas capturadas na multidão.

- olha, você viu que o Jorginho fez ontem no churrasco?

- vi, menina! Que menino doido, né?

Não sabia quem era Jorge, mas já concluiu que ele era só mais um incompreendido tentando alegrar uma festa que nem devia estar tão legal assim.

Seguia seus passos com cuidado, fazia todo o esforço do mundo para não voltar para trás.  Mesmo com o vento frio quase cortando seu rosto.

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Sentada na praça central. Ela troca seu olhar entre o livro e as pessoas caminhando. Pensa se em algum momento da vida as pessoas caminhariam todas para uma mesma direção. Lê mais um pouco do livro sem prestar atenção e conclui: 

- as pessoas já não fazem isso?

Levanta, se espreguiça, respira fundo e decide ir pegar um livro mais interessante na biblioteca. 

No caminho imagina se não devia comprar um e-book ou algo do tipo. Caminha mais um pouco e decide que poderia conviver bem com as duas coisas.

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Largado no chão, ele pensa se vai conseguir comer algo hoje.

Procura algum dinheiro no bolso e encontra poucas moedas. Parece o suficiente para um pastel ou um lanche.

Mas o fermento do pão não vai fazê-lo esquecer de que pode não ter dinheiro para amanhã.

Caminha cambaleando até o bar, pede quatro doses e pensa em não se lembrar. 

Reza para não se lembrar.

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Parado dentro do carro, desvia o olho do menino que joga as bolinhas no semáforo. Nega um trocado pelo pequeno espetáculo, mas o observa de canto, condolente. 

Pensa que poderia ser seu filho ali, mas pensa também que nunca deixaria um filho seu passar por isso. Não importa a situação.

- Talvez ele não tenha pais – pensa.

E acelera até o próximo semáforo.

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No parapeito do terraço do prédio, ele não demonstra qualquer emoção. Com a mão suja de tinta de caneta azul – borrada da carta que acabara de escrever – observa o movimento das ruas.

Vê as pessoas seguindo para todos os lados. Os carro, apressados. Todos no seu caminho, na sua linha. Mesmo que seja torta como o do bêbado. 

Por não encontrar o seu, e nem a sua, decidiu se jogar da vida. 

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Brincando no balanço, ela pensa em montar o maior castelo de areia do parque. Imagina em rodeá-lo com um fosso para depois preenchê-lo com água do bebedouro. Seria o fosso dos jacarés que impediriam qualquer malfeitor de entrar no castelo que moraria sua família real, e a real também.

Ao pular do balanço, ela torce o pé e então vem as lágrimas.

No meio do choro percebe que não há jacaré que não possa não deixar o machucado entrar em seu castelo.
Logo pensa em fazer uma ponte.

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Ao perceber o sol se pondo ele para. Ele para e observa.

Pensa que não parava já há algum tempo. Olha em volta e vê que ninguém mais parou. Pensa se está fazendo a coisa certa.

Olha mais uma vez para o pôr-do-sol, sente o vento fresco de cheiro suave e percebe as nuvens coloridas no céu ainda mais colorido.

E então tem a certeza de que está.

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